A portaria do prédio onde eu moro tem cerca de seis metros de extensão. Na parede oposta à entrada, encrustrado entre as placas de mármore branco, o elevador.
O prédio tem treze andares, cada um com oito apartamentos mal divididos, abrigando ao todo umas 300 pessoas nesse joelho-de-porco.
Nessas circunstâncias, tamanha a demanda do ascensor, dá pra imaginar que esperar o elevador é como aguardar a volta do cometa Halley: demora.
Ciente disso, certo dia após o expediente na repartição, com o saco estourando após viajar 20 km em pé num cata-corno onde no parabrisa diz "ar condicionado" mas que dentro sopra uma leve brisa quente, com o filete de força que me resta, finalmente chego ao prédio.
Mal coloco os pés na portaria, vejo a porta do elevador aberta. "Beleza", penso eu. "Logo, logo vou estar em casa". Em seguida, avisto um dos moradores entrar no elevador. Ele se vira e num átimo nossos olhares se cruzam.
"O sujeito me viu", eu penso (eu sei), mas no instante seguinte o morador desvia o olhar. A gente sabe quando alguém está tentando fingir que não te viu, pois os olhos ficam com aquela aparência de zumbi, um olhar opaco, sem foco, mas ainda assim tenso. Se bobear o cara nem respira.
Avanço rápido pelo chão de mármore, enquanto a porta do elevador vai se fechando, mas consigo ver o movimento do braço do sujeito lá dentro em direção ao painel interno.
"Ele vai segurar a porta", penso eu, "afinal somos moradores do mesmo prédio, ele viu que estou andando apressado em direção ao elevador, gesticulando para que ele segure o elevador". Chego a soltar um "ei" tímido que ecoa pela portaria sem mobília, último apelo lançado para a solidariedade alheia.
Continuo me aproximando: mais três passos e estou no elevador. Só que o sujeito parece ter apertado não o botão para abrir a porta, mas o outro, o que a fecha mais rápido. Estou tão perto agora que consigo ouvir o botão sendo acionado insistentemente pelo dedo do morador que está dentro do elevador, enquanto o porta desliza os últimos centímetros que restam.
Agora estou de pé, arfante, encarando o aço escovado da porta fechada. O elevador ainda não subiu, mas também não abre mesmo comigo apertando o botã, tentando chamar o elevador de volta. Do outro lado sei que o sujeito mantém pressionado o botão de fechar a porta, numa espécie de queda de braço digital.
Até que, finalmente, o elevador parte, me largando embasbacado e suado na portaria vazia. Já não há muito a fazer, a não ser colocar o morador na lista.